Da sela à passarela: os 80 anos do mestre Espedito Seleiro.
O artesão e mestre do couro, Espedito Seleiro completa 80 anos de nascimento nesta terça-feira (29)
A Prefeitura Municipal de Nova Olinda através da Secretaria Municipal de Cultura, Esporte e Turismo, o Serviço Social do Comércio – SESC preparam várias surpresas para o aniversariante ilustre como as visitas de grupos folclóricos, personalidades, artistas e autoridades públicas. No final da tarde será realizada uma homenagem solene com as presenças dos familiares e amigos do mestre, prefeito doutor Ítalo, secretário de estado da cultura Fábio Piúba, secretário municipal de Cultura, Wiliam Luxo, dentre outras autoridades. São esperados ainda os representantes da Fundação Casa Grande, Câmara de Vereadores, dentre outras organizações.
História
Nasceu em 29 de outubro de 1939 na cidade de Arneiroz, no Sertão dos Inhamuns. Aos 10 (dez) anos de idade mudou-se para Nova Olinda. Recebeu o título de cidadania novo-olindense outorgado pela câmara municipal de Nova Olinda.

Entrevista
Há poucos dias de completar 80 anos de vida, Espedito Veloso de Carvalho, o artesão (Espedito Seleiro), recebeu a equipe do Informativo Digital em sua oficina na rua Monsenhor Tavares no centro de Nova Olinda. Mostrando uma forte vitalidade, boa saúde e uma impressionante disposição para o trabalho o mestre Espedito Seleiro falou dos seus 80 anos de história em especial dos fatos que marcaram a sua trajetória de sucesso desde a instalação da sua primeira oficina de artesanato em couro baseada na confecção de selas para animais até a construção do atual ateliê que atende as passarelas de moda para o mundo inteiro.
O mestre Espedito explicou que antes de instalar a sua oficina na cidade de Nova Olinda esteve retirante pelo sul do país.
“Agente se complicava para arrumar o mantimento ai eu resolvi dar uma volta”
Essa volta durou cerca de 2 anos.
Na década de 60 após passar a temporada nas praças do sul do Brasil em busca de oportunidades “para ganhar dinheiro” o jovem Espedito Veloso de Carvalho se estabeleceu na cidade de Nova Olinda após uma fracassada tentativa de crescer como comerciante de sandálias de couro e cereais numa mercearia “na entrada da cidade”. Com a mulher grávida e sem “nenhum tostão no Bolso” o artesão decidiu apostar na arte de confecção e vendas de selas.
“Eu só tinha a mulher buchuda e outra coisa não”
Além de selas, ele confeccionava gibão de couro “arreio completo para vaqueiro” destinado a vestir vaqueiros e cobrir os animais de montaria. O que era produzido era vendido por ele mesmo nas feiras municipais da região. Mas com o passar do tempo apesar da boa fama que lhe rendeu o nome de Espedito Seleiro o artesão esteve prestes a ver o seu segundo negócio falir.
“Eu ia pra feira e não vendia mais”
Atendendo a exigência de um chefe de um grupo de ciganos “arranchados” em Nova Olinda Espedito Seleiro fez uma sela para montar a burra do cigano empregando pela primeira vez as cores e brilhos que são uma marca das suas peças até hoje.
“Foi aonde chamou a atenção do pessoal”
O homem, era um dos Feitosa dos Inhamuns, queria uma sela diferenciada, que o destacasse frente aos demais. Para atender as exigências do cigano o artesão teve de inovar na confecção da sela.
Seguindo os ensinamentos e técnicas do pai, Raimundo Seleiro, ele usou pigmentos naturais e técnicas de tingimento de couro e assim, descobriu o angico que tinge de marrom, o urucum que traz o vermelho, a cinza da capimbeira que colore de branco, a lama que traz o preto.
“O cigano ficou satisfeito, e o povo que viu ficou todo admirado”
Chamou tanto a atenção que de ciganos e tropeiros da região o artesão conquistou clientes dos palcos de passarelas, designers, estilistas, gente da tv e do cinema, ganhou fama no rádio, nos jornais e na televisão no mundo inteiro.
“Não adianta você ter uma fama e você mesmo querer se orgulhar, querer se engrandecer você mesmo com aquilo”
Com essa máxima de humildade e simplicidade o artesão Espedito Seleiro, como revelou que prefere ser chamado – apesar de gostar e prezar pelo título de mestre – fez da pequena oficina de confecção de peças de couro, com a arte ensinada pelo pai Raimundo Seleiro, um grande ateliê de arte em couro que hoje é um dos mais visitado no Brasil e o primeiro museu dedicado à história das quatro gerações de uma família de seleiros.
O octogenário já poderia se dar por satisfeito e aposentar a faca que usa para confeccionar os seus traços, mas diz que antes disso ainda precisa aprender amolar a faca coisa que ele revela que em 70 anos praticando ainda não aprendeu.
Mas o artesão fez outras revelações igualmente importantes e interessantes. Anunciou que pretende ampliar o espaço dedicado ao museu do couro para expor outras peças usadas por seu pai e seus avós na arte de domar o couro. Declarou que esse é um sonho antigo e que jamais tinha revelado para ninguém.
“Porque eu tenho umas peças antigas que eu queria também botar ai pra mostrar, certo? E também aumentava mais as peças do museu que eram do meu pai e do meu avô”
Espedito Seleiro contou, inclusive, que esse é um pedido de presente de aniversário que tem a fazer a Deus.
“Eu tenho o plano, se Deus quiser, de fazer outro repartimento para botar essas coisinhas lá”
O artesão disse que outro pedido que têm a fazer nos seus 80 anos é viver pelo menos mais uns 10 anos, afirmou que tem a certeza que a sexta geração de seleiros está garantida na pessoa dos seus filhos o Manim e Welington.
“quero preparar a vereda para a minha familia, meus amigos, tudo que pertencer a mim, tudo seguindo aquele camizim”
Sobre os 80 anos ele disse
“A idade é 80 anos, mas o coração é de 18”
Sobre a fama e as conquistas ele diz que é muito grato ao povo de Nova Olinda que o acolheu, inclusive, a câmara municipal lhe outorgou o titulo de cidadania novo-olindense, tem gratidão especial ao Alembergue Quindins e a Fundação Casa Grande que segundo ele foi quem “abriu as portas do município para o mundo, aos turistas e visitantes.
“Eu pelo menos não troco a Nova Olinda por lugar nenhum”
O amor a Nova Olinda ele faz questão de expressar firmemente, uma forma de corresponder as oportunidades que o lugar até hoje lhe oferece, o carinho e o respeito são recíprocos.

Trajetória de Sucesso.
Nos anos 2000, veio o primeiro chamado para a fama. O artesão teve peças incluídas no figurino do filme “O Auto da Compadecida”, do diretor Guel Arraes.
Em 2005, criou calçados e acessórios para o desfile da Cavalera (Verão 2006) na São Paulo Fashion Week (SPFW), marcando sua estreia na principal vitrine de moda brasileira.
Fez as roupas que o ator Marcos Palmeira usa no filme “O homem que desafiou o diabo” do diretor Moacyr Góes exibido na mostra Panorama, no Festival do Rio 2007.
Em 2008, foi agraciado com o título de Mestre da Cultura Tradicional Popular do Ceará, concedido pelo Governo do Estado por seus relevantes serviços prestado à cultura e à arte.
Em 2011, recebeu a Ordem do Mérito Cultural na classe de comendador, conferida pela Presidência da República Federativa do Brasil, pela sua contribuição à cultura brasileira.
Das Universidades Estadual e Federal do Ceará, ganhou ainda o título de notório Saber em Cultura Popular, nos anos de 2016 e 2019, respectivamente.
Com os irmãos designers de renome internacional, Fernando e Humberto Campana, Espedito desenvolveu peças para a coleção Cangaço, a exemplo de armários, cadeiras, sofás e mesas de centro. O trabalho ganhou destaque na feira Design Miami, realizada em dezembro de 2015, nos Estados Unidos.
No mesmo ano, recebeu convites para desenvolver modelos exclusivos para as marcas cariocas Farm e Cantão.
Em fevereiro deste ano, o criador também atravessou o Atlântico para apresentar suas peças na Embaixada do Brasil, em Londres.
O artesão protagonizou documentários, teses de mestrado, livros e cordéis; suas peças ganharam destaque em filmes, novelas e passarelas. O seu trabalho está imortalizado na literatura pela Editora SENAC São Paulo no livro “Espedito Seleiro – Meu Coração Coroado” de autoria do escritor Eduardo Motta.
Na Marquês de Sapucaí, em março, num carro alegórico da Escola de Samba “União da Ilha do Governador”, cujo enredo de 2019 era “A Peleja Poética entre Rachel e Alencar no Avarandado do Céu”. Uma ala de brincantes vestidos com seu artesanato em couro também marcou a homenagem no Rio de Janeiro.
Em setembro passado foi premiado com o Troféu Sereia de Ouro do Sistema Verdes Mares.
Os arabescos em couro do mestre Espedito Seleiro estavam presentes desde a decoração da passarela até as roupas e acessórios utilizados pelos modelos durante a 48ª edição da São Paulo Fashion Week (SPFW) 2019.

Nota do editor
Atualmente o mestre Espedito Seleiro que tem como padrinho da sua fama um cigano tropeiro conta com clientes como Regina Casé, Luciano Huck e Guel Arraes. Tanto glamour parece não combinar com a simplicidade deste homem simpático e hospitaleiro. Mas combina sim, basta olhar para o design contemporâneo que ele consegue dar ao couro curtido que pela maestria das suas mãos se transforma em bolsas maravilhosas e lindas sandálias e cintos e tudo mais que sai do alto da sua inteligência em pleno vigor aos 80 anos.
Ao lado de todos os equipamentos culturais e turísticos de que Nova Olinda dispõe para se firmar como Destino Indutor do Turismo Regional o Mestre Espedito se destaca porque como nenhum outro ele tem um carisma encantador e uma disposição incrível para atender aos turistas do mundo todo que visitam Nova Olinda, também, para conhecer o trabalho do Mestre Espedito Seleiro.
Veja mais fotos:
- ATELIÊ ESPEDITO SELEIRO.
- DESFILE NA MARQUÊS DE SAPUCAÍ NO RIO DE JANEIRO
- EXPOSIÇÃO EMBAIXADA DO BRASIL EM LONDRES.
- FACHADA DO ATELIÊ.
- FILME O AUTO DA COMPADECIDA
- FILME O AUTO DA COMPADECIDA
- MESTRE DA CULTURAL TRADICIONAL POPULAR.
- MUSEU DO COURO.
- O MESTRE PRODUZINDO OS SEUS ARABESCOS.
- RANILSON SILVA ENTREVISTA ESPEDITO SELEIRO.
- SPFW DESFILE CAVALEIRA, 2006.
- TROFÉU SEREIA DE OURO 2019.